Comunidade de Joanesburgo, onde morou Mandela,
é uma das mais pobres do país, mas fica a apenas 10 minutos
de bairros ricos da cidade
Alexandra é um nome que costuma causar calafrios em bairros nobres de Joanesburgo. Não exatamente por causa de sua pobreza, mas, principalmente, pela sua proximidade. Ao contrário da maioria das outras comunidades, ela é visível. Está a apenas dez minutos de carro de alguns dos centros mais ricos da cidade mais próspera de toda a África. Perto o suficiente para lembrar a enorme distância que ainda separa a África do Sul da igualdade social. Falar de Alexandra no país é, em primeiro lugar, lembrar da violência, depois da pobreza, e sempre usá-la como exemplo de um país que ainda não se resolveu.
- Dizer que Alexandra é violenta é uma meia verdade. Nunca tive problemas aqui, mesmo à noite. Às vezes alguém é baleado ou roubado, mas são casos mais isolados e controláveis. Não é como no Brasil, por exemplo, onde a polícia nem consegue entrar em certas áreas. Aqui o crime não é organizado como em outros países. Mas há muita gente que infelizmente sai daqui para assaltar em bairros como Sandton. Eles veem a riqueza de lá e querem ter o mesmo. Isso traz uma imagem ruim para nós - explicou Albert Chief Mathebula, nascido há 50 anos em Alexandra.
Dentre os 470 mil habitantes, todos são negros. É assim desde o início do século passado. Durante o regime do Apartheid, o governo branco criou áreas afastadas do centro da cidade, como Soweto, para entulhar os negros. As comunidades mais próximas da cidade foram desocupadas à força. Mas Alexandra, que já era enorme, resistiu. Seu morador mais famoso foi Nelson Mandela, que viveu lá logo que chegou a Joanesburgo, um pouco antes de se mudar para Soweto. Anos mais tarde, em 1994, Mandela ajudou a acabar oficialmente com a segregação racial. Se isso, por si só, não resolveu a vida de todos, ao menos serviu para trazer esperança.
- Nossa vida é muito melhor do que na época do Apartheid, simplesmente porque hoje temos o direito de votar. Podemos participar da construção do nosso futuro, escolher e depois cobrar nossos representantes. Mas não adianta achar que um presidente pode fazer tudo sozinho, é preciso haver pessoas capacitadas lá para servir ao povo. Só que normalmente essas pessoas só querem saber de servir a si mesmas, é assim em quase todos os lugares - analisou Albert.
Matlata Thabong, de 12 anos, também morador de Alexandra, já faz parte de uma geração diferente. Daquela que nasceu em um país democrático, que não viveu o Apartheid e que talvez por isso não veja o país em preto e branco como os mais velhos. Ao apontar os problemas de Alexandra, ele não fala de política, emprego ou violência. Mira em pontos muito mais simples.
- Eu gosto de viver aqui, só não gosto da sujeira. As pessoas jogam muito lixo na rua, não acho isso certo e não faço isso. Quero minha cidade limpa - disse ele.
Nesta quinta-feira, Matlata foi uma das crianças convidadas pela Fifa para a inauguração do projeto Football For Hope (Futebol para Esperança, na tradução para o português) em Alexandra. Um espaço para a comunidade com quadras de futebol, basquete e tênis.
- A gente até já jogou tênis aqui, mas o que gosto mesmo é de futebol. Vamos à escola de manhã e à tarde temos um campo legal pra jogar - afirmou o animado menino.
Caso Thabong consiga manter a rotina de livros e bola, tem boas chances de se tornar um adulto saudável, aposta Albert. Depois de meio século em Alexandra, ele aprendeu que a receita para que um dia o lugar deixe de ser visto com temor é simples.
- Nosso caminho é colocar nossas crianças na escola, dar oportunidade para elas praticarem esportes, aprenderem música, ocuparem a cabeça. Só assim chegaremos ao dia em que nenhum sul-africano será pobre. Quem sabe daqui a uns 20 anos…
Fonte: http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Futebol/0,,MUL1544703-17852,00-ALEXANDRA+SIMBOLO+DA+DESIGUALDADE+SULAFRICANA+NA+PRINCIPAL+CIDADE+DO+PAIS.html